O Protesto

Um demônio estava dormindo no telhado de uma residência quando um de seus supervisores chegou e lhe deu uma bofetada na orelha dizendo:
-Acorda, mequetrefe! Tu por acaso não tem nada pra fazer?
-Não, senhor, agora não. Eu tinha, mas já faz um tempo que eu chego aqui e só fico olhando, e hoje acabei até cochilando. Lá de vez em quando eu sinto uma presençazinha de poder chegando mas é só dar um peteleco na mente deles que volta tudo ao normal.
-Isso é um absurdo! O chefe vai saber disso!
-Ah, ele já deve saber. Eu não sou o único. Tu é que tá demorando demais ao rodear a terra. Tem que aprender com o chefe meios mais rápidos...
-Não importa o que acontece, você precisa continuar trabalhando! Existem leis que não podem ser quebradas!
-É mesmo. Sabe, se um humano estiver trabalhando e outro humano chegar no trabalho dele e começar a fazer o serviço dele de graça e por conta própria, sem ser contratado pela empresa, o invasor é expulso dali ou contratado pois não pode trabalhar fora da legalidade. Mas aqui, a coisa tem virado a casa da mãe Joana. Esses caras que temos que afligir fazem o nosso serviço! E tem uns aqui que conseguem ser mais malignos que os piores demônios que eu já conheci! Chega a dar medo de pensar no que eles fariam se fossem realmente consagrados ao Altíssimo.
-Isso não vai ficar assim.
O supervisor saiu furioso, lançando setas e dardos inflamados para todos os lados e vociferando palavras de maldição. No dia seguinte, fez chegar um documento às mãos do principe das trevas:
"Vossa Alteza,
Chegou a meu conhecimento que existem soldados seus que estão dormindo no ponto porque argumentam que os humanos, principalmente os chamados "crentes", estão roubando-lhes as funções e tarefas, deixando-os entregues ao comodismo e à diversão de assistir às situações por estes perpetradas.
Por essa razão, reivindico que vossa alteza se apresente diante Dele, com base em Sua Palavra, e acuse os servos Dele de mais este pecado, e granjeie diante Dele a permissão de afligirmos os que se dizem Dele até a morte. Por mais que Ele os queira proteger, eles não são como Jó, e assim podemos pagar-lhes o salário do pecado, uma vez que pareça ser isso que desejam.
Dessa forma, poderemos voltar a fazer o que sempre fizemos e teremos reforços na luta contra aqueles poucos fiéis que insistem em viver em santidade, nos dando muito trabalho.
Ciente de que essas disparidades no mercado de trabalho logo serão sanadas, e crendo nos vossos ardis para reivindicar os direitos da categoria, me despeço com votos de um reinado pleno de vossa parte.
Aguardando pronunciamento,
Demônio Supervisor."
O príncipe, ao receber a petição, primeiro riu. Depois percebeu que era uma questão de autoridade atribuida não respeitada e ficou irado. Preparou o seu discurso e foi prontamente acusar os "irmãos" diante do trono.
Na semana seguinte, os demônios estavam trabalhando novamente. Haviam conseguido provar que podiam tocar nos bens e nas propriedades das igrejas porque tinham legalidade nelas. Começaram a haver incendios e desmoronamentos, e várias pessoas começaram a ser mortas. Entre elas, muitos inocentes.
Porque eles exigiram cumprir a lei que era boa pra eles. Mas quem disse que eles teriam escrúpulos?
Juliano Leal - MRM/MARP

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